As fintechs vão acabar com os bancões? Felipe Ruiz duvida que isso aconteça

Quem acompanha de perto as notícias de negócios já se acostumou a ler, com uma certa frequência, matérias que pregam que o fim dos bancos tradicionais está se aproximando. Em geral, a tônica das reportagens é parecida, enumerando fatores que suportam a visão de que os bancos digitais engolirão os “bancões”.

De fato, as fintechs têm ganho cada vez mais espaço e notoriedade em um cenário historicamente dominado apenas pelas grandes instituições financeiras. No entanto, os resultados recentes divulgados pelos maiores bancos do país mostram que eles ainda possuem um negócio sólido e com enorme capacidade de gerar bons retornos para seus acionistas.

No primeiro trimestre de 2021, os quatro maiores bancos de capital aberto do Brasil (Itaú Unibanco, Bradesco, Banco do Brasil e Santander) apresentaram lucro líquido combinado de R$ 21,8 bilhões, uma alta de 46,4% em relação ao resultado do mesmo trimestre do ano passado. A queda nas provisões foi a grande responsável pela alta nos lucros dos bancos, mas outros fatores também contribuíram para o bom desempenho, como melhorias na margem financeira e reduções de custos. Mesmo com algum risco de piora nos indicadores de inadimplência no horizonte, alguns deles, como o Banco do Brasil, já voltaram a distribuir robustos proventos. Só em 2021, entre dividendos e juros sobre capital próprio o banco já distribuiu mais de R$ 3,3 bilhões aos seus acionistas.

Os bancos digitais, por outro lado, nasceram com uma proposta inovadora e vêm contribuindo para o aumento da bancarização no país. Além disso, também têm desafiado os incumbentes do setor, oferecendo uma experiência diferenciada a custos atrativos. Mas para crescerem de forma rentável, as fintechs ainda esbarram em alguns grandes obstáculos.

A maior parte dos bancos digitais não possui vantagens competitivas duradouras que não possam ser replicadas pelos bancos tradicionais. O modelo de negócio das fintechs, em geral, não apresenta grandes inovações tecnológicas ou de ofertas de serviços, se baseando quase que exclusivamente no apelo do canal digital (mobile), que também é oferecido pelos bancos convencionais, e nas baixas tarifas e taxas.

Além disso, por mais que clientes estejam abrindo conta nos bancos digitais, essas contas ainda são essencialmente secundárias. Isto é, o cliente mantém uma conta principal em uma instituição de sua confiança, onde deixa seu dinheiro aplicado, e usa a do banco digital somente para realizar transações e usar cartão de crédito. Isso, naturalmente, eleva os custos de captação dessas instituições e as torna menos competitivas.

Finalmente, a base de usuários dos bancos digitais ainda está muito concentrada nos jovens, que são o público com maior afinidade com novas tecnologias e maior apetite a risco. Segundo pesquisa da agência Cantarino Brasileira, 59% dos usuários de fintechs têm até 29 anos. Isso é bom por um lado, pois mostra que estão ditando tendências, mas por outro acaba limitando o crescimento dessas instituições, já que a maioria da população bancarizada ainda demanda um modelo híbrido, que combina atendimento físico e digital.

O ano de 2020 trouxe importantes desafios para o setor bancário, como a forte queda na Selic, a introdução do teto do cheque especial e o aumento da alíquota da CSLL, que passou de 15% para 20% (e, em 2021, para 25% de julho a dezembro). Isso tudo sem contar um ambiente ainda mais competitivo. Mesmo com todas essas questões, entretanto, ainda é possível enxergar um futuro próspero para o setor como um todo.

O surgimento de novas empresas inovadoras combinado com a reinvenção dos bancos tradicionais, em última instância, beneficia os usuários dos serviços. Aliada a isso, a agenda do BC voltada ao maior estímulo da competição bancária também tende a ampliar o acesso da população aos serviços financeiros. Haverá, assim, mais competidores brigando por uma fatia de um bolo que também irá crescer. Bancos digitais se tornarão um pouco mais tradicionais, e os tradicionais cada vez mais digitais.
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Felipe Ruiz é engenheiro com MBA pelo MIT e sócio-fundador do Ações Garantem o Futuro

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